Em vigor desde 01 de janeiro de 2024, a nova Lei nº 14.754/2023 altera o regime tributário sobre os investimentos mantidos fora do país por pessoas físicas residentes no Brasil, em especial sobre as aplicações financeiras no exterior e seus respectivos rendimentos, a tributação sobre lucros e dividendos de entidades controladas em território estrangeiro – as chamadas “offshores” – e a regulamentação dos “trusts” no regime tributário brasileiro, além da tributação sobre rendimentos de fundos fechados no Brasil. Confira abaixo as principais mudanças.
Aplicações financeiras no exterior
Anteriormente, as aplicações financeiras no exterior não estavam sujeitas a regras de tributação específicas, previstas expressamente em lei, o que causava dúvidas sobre a interpretação e, consequentemente, significativa insegurança jurídica. Às vezes, era aplicado o tratamento sobre o ganho de capital, com alíquotas variando de 15% a 22,5% e, em outras ocasiões, aplicava-se a mesma tributação do carnê-leão, com alíquotas de até 27,5%.
A nova Lei altera as regras de tributação sobre aplicações financeiras no exterior, inserindo um regime uniforme e mais simples. Pelas regras da Lei nº 14.754/2023, as aplicações financeiras mantidas no exterior passam a estar sujeitas à alíquota única de 15%.
A tributação passará a ocorrer apenas uma única vez no ano, isto é, quando da entrega da Declaração de Ajuste Anual (DAA). Ao preencher a sua DAA, o contribuinte deverá somar o total de rendimentos de aplicações financeiras percebidos no exterior no ano base (por conta de eventos como recebimento de juros e resgate de títulos no ano-base, mantendo-se o regime de caixa como momento de apuração da renda tributável), e submetê-lo à tributação na DAA à alíquota de 15%.
Neste contexto, é relevante citar que, embora o momento do efetivo recolhimento do imposto tenha sido alterado, o fato gerador de imposto de renda sobre rendimentos provenientes desses ativos ocorre no momento do efetivo recebimento ou disponibilidade, de modo que sua apuração mensal tenha sido mantida, inclusive para fins de conversão da moeda estrangeira em moeda nacional.
Conforme o novo texto, o conceito de aplicações financeiras no exterior é entendido em sentido amplo, isto é, compreendendo quaisquer operações financeiras mantidas fora do Brasil, exceto aqueles ativos tratados como entidades controladas no exterior, os quais passaram a receber regras próprias, conforme veremos mais adiante. O enquadramento de ativos virtuais e de carteiras digitais como aplicações financeiras no exterior estarão sujeitos a futura regulamentação da Receita Federal do Brasil (RFB).
Compensação de prejuízos
Apesar de a apuração mensal dos rendimentos percebidos ser imprescindível, a nova Lei também oferece a oportunidade de compensação dos prejuízos incorridos dessas aplicações financeiras, propiciando, portanto, um melhor planejamento por parte do contribuinte. Há que se considerar, ainda, a possibilidade de compensação pelo imposto de renda recolhido em países com os quais o Brasil mantém acordo para evitar a dupla tributação ou com reciprocidade de tratamento em relação aos rendimentos, como é o caso dos EUA, Reino Unido e Alemanha.
Entidades controladas no exterior (“Offshores”): fim do diferimento fiscal
Até a entrada em vigor da Lei nº 14.754/2023, o tratamento conferido às entidades controladas no exterior – popularmente conhecidas como “offshores” – possibilitava o diferimento fiscal para os investidores nestas entidades, ou seja, era possível protelar a incidência do imposto sobre a renda somente para o momento da efetiva distribuição dos recursos dos lucros e dividendos da Pessoa Jurídica para a Pessoa Física residente no Brasil.
Com o novo regime, entretanto, passou a vigorar a determinação de que os lucros auferidos no exterior serão tributados, obrigatoriamente, sob alíquota fixa de 15% em 31 de dezembro de cada ano em que forem apurados no balanço, independentemente da sua distribuição para o(s) investidor(es), de acordo com as regras estabelecidas na legislação.
Além do registro observando os padrões internacionais de contabilidade ou aos padrões contábeis brasileiros (este último obrigatório se a entidade em questão for localizada em país com tributação favorecida ou beneficiária de regime fiscal privilegiado), tais lucros devem ser convertidos em moeda brasileira, conforme a cotação oficial de fechamento da moeda estrangeira divulgada, para venda, pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil do mês de dezembro; e incluídos na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda (DAA) do mesmo ano, na ficha de bens e direitos, como custo de aquisição de crédito de dividendo a receber da controlada – direta ou indireta – com a indicação do respectivo ano de origem.
Alternativamente, a nova Lei possibilita ao contribuinte o reporte das entidades controladas no exterior de forma “transparente”, ou seja, separando cada ativo inexplícito na Declaração de Imposto de Renda e os equiparando, sob o ponto de vista fiscal, aos bens diretamente detidos pela pessoa física, incluindo a estrutura como um ativo único na Declaração de Imposto de Renda, independentemente da quantidade de ativos que a compõem, e submetendo-a à tributação anual com base no lucro contábil.
É importante destacar que a opção pelo modelo de reporte dos rendimentos é irrevogável e irretratável durante todo o período em que a pessoa física detiver aquela entidade controlada no exterior. Desta forma, uma vez que o indivíduo opte pelo modelo de reporte a ser adotado, não existirá a possibilidade de mudança.
Vale ressaltar ainda que estão sujeitas ao novo regime de tributação somente as “offshores” – controladas direta ou indiretamente – que se adequarem em pelo menos uma das seguintes condições:
1. estejam localizadas em país ou em dependência com tributação favorecida ou sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado; ou
2. apurem renda ativa própria inferior a 60% da renda total.
“Trusts”
Dando fim à indefinição jurídica relativa à figura do “trust”, a Lei nº 14.754/2023 determina que os bens e direitos que compõem este tipo de arranjo deverão ser compreendidos, de forma geral, como de titularidade do instituidor (“grantor”), sendo transferidos à titularidade do beneficiário somente quando:
1. da distribuição pelo “trust”, conforme regras estabelecidas em seu documento constitutivo;
2. no evento de falecimento do instituidor; ou
3. caso o instituidor renuncie, de forma irrevogável, do seu direito do patrimônio transferido ao “trust”, o que ocorrer primeiro.
De acordo com a nova Lei, a mudança de titularidade será tratada como doação, se ocorrida durante a vida do instituidor, ou como transmissão “causa mortis”, se decorrer de seu falecimento.
Adicionalmente, para efeitos de tributação, os rendimentos e ganhos de capital originados dos bens e direitos detidos pelo “trust” serão considerados como tendo sido auferidos pelo titular e, portanto, estarão sujeitos à tributação pelo imposto de renda da pessoa física sob alíquota fixa de 15%, observando as novas diretrizes estabelecidas pela Lei. Como regra geral, os bens e direitos objetos do “trust” deverão ser informados pelo seu respectivo custo de aquisição na Declaração de Imposto de Renda do titular.
Por fim, vale reforçar a existência de prazo estabelecido até 9 de junho de 2024 para a alteração da escritura do “trust” ou respectiva carta de desejos, a fim de fazer constar redação específica que obrigue o atendimento pelo responsável (“trustee”) às disposições estabelecidas por esta Lei.
Atualização do Valor de Ativos
O novo regime tributário também prevê a possibilidade de investidores pessoa física, residentes no Brasil, atualizarem o valor dos bens e direitos no exterior regularmente descritos na Declaração de Imposto de Renda para o ano-base de 2022, para o seu respectivo valor de mercado em 31 de dezembro de 2023. Para isso, deverão oferecer como tributo a diferença para o custo de aquisição à alíquota de 8%. A adesão para atualização desses bens e direitos deverá ser feita através de declaração própria, cujo modelo ainda deve ser disponibilizado pelo fisco federal para quitação do imposto devido até 31 de maio de 2024.
Importante: ativos adquiridos ao longo do ano-calendário de 2023 não poderão ser atualizados.
Fim de isenções fiscais
Além disso, a Lei nº 14.754/2023 põe fim a duas modalidades de isenção fiscal, bastante relevantes às pessoas físicas residentes no Brasil e cujo patrimônio foi constituído durante o período de não residência fiscal e/ou que fora constituído de rendimentos originariamente auferidos em moeda estrangeira, a saber:
1. o fim da isenção do imposto sobre o ganho de capital auferido na venda de bens e direitos adquiridos durante o período de não residência fiscal no Brasil; e
2. o fim da isenção sobre a variação cambial computada na venda de ativos adquiridos originariamente em moeda estrangeira.
No entanto, foi mantida a isenção sobre a variação cambial de depósitos em moedas estrangeiras não remuneradas, enquanto mantidas em bancos no exterior.
Tributação de Fundos fechados
Finalmente, dentre as diversas novidades trazidas pela Lei, é importante apontar também que os fundos fechados passaram a estar sujeitos ao regime de tributação via “come-cotas”, em maio e novembro de cada ano, assim como ocorre com os fundos de investimentos abertos.
Regulamentação complementar
Recém-publicada, a Lei nº 14.754/2023 ainda carece de normativas complementares que discorram sobre detalhes práticos da implementação deste novo regime, bem como da atualização de bens e demais ações que venham a ser necessárias por parte dos contribuintes, conforme explicitado acima. Até o momento, a Receita Federal publicou dois dispositivos complementares, além de um compilado de perguntas e respostas sobre o tema em seu site oficial:
Instrução Normativa n°. 2.166/2023, que dispõe sobre o recolhimento do imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos apurados nas aplicações nos fundos de investimentos de que tratam os Arts. 27 e 28 da Lei 14.754/2023; e
Ato Declaratório Executivo CODAR n. 23, que estabelece o código de recolhimento do imposto de renda incidente sobre a atualização do valor de bens e direitos no exterior (código 7238).
Antes e depois: o que muda com a Lei n° 14.754/2023
Hussein – Assessoria tributária internacional
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